Na SPFW N59, Alexandre Herchcovitch apresentou uma das coleções mais marcantes da temporada. O estilista transformou o tradicional formato de desfile em uma experiência sensorial e imersiva ao levar sua marca, Herchcovitch; Alexandre, para a icônica casa noturna Blue Space — palco emblemático de shows de drag queen em São Paulo. Com luz negra, cristais brilhando, neon pulsante e uma plateia em pé cercando a passarela, o evento se tornou mais do que uma apresentação de moda: foi um verdadeiro show.
Moda como performance: brilho, história e expressão
A escolha da Blue Space não foi planejada inicialmente, mas se revelou perfeita para traduzir o espírito da coleção. Em um ambiente onde shows de drag queens são tradições desde os anos 1990, Herchcovitch resgatou a energia de seus primeiros desfiles em boates e promoveu um encontro entre moda, performance e memória afetiva. A passarela elevada, com cerca de um metro de altura, sem cadeiras ou lugares marcados, intensificou o senso de proximidade entre público e criação.
A estética foi um espetáculo à parte: luz negra ativava o brilho dos cristais Swarovski nas joias e bordados, enquanto cores neon — como verde, roxo e laranja — ganhavam vida sob diferentes iluminações. Essa dança de luz e cor reforçava o caráter teatral da apresentação, com referências à cena disco e ao universo noturno. Mas o visual ousado também dialogava com um repertório técnico e conceitual denso.


Uma coleção múltipla, que mistura passado e futuro
A coleção apresentada por Herchcovitch foi construída em blocos distintos, com propostas que conversam entre si, mas mantêm sua singularidade. A abertura trouxe looks inspirados em camisas de rúgbi com proporções amplas, combinadas a uma modelagem geométrica que remete aos anos 1960. Mangas volumosas davam um toque de drama à silhueta esportiva.
Coleção inverno/primavera 2025 de Herchcovitch; Alexandre (Foto: reprodução/Fernanda Calfat/Getty Images Embed)
Na sequência, vestidos de veludo cotelê cortados no viés chamaram atenção pelo refinamento técnico e sensibilidade estética. Os recortes com tecidos vintage no busto misturavam delicadeza e potência, sintetizando o DNA criativo de Herchcovitch: uma moda que subverte, mas sem perder sofisticação.
Coleção inverno/primavera 2025 de Herchcovitch; Alexandre (Foto: reprodução/Fernanda Calfat/Getty Images Embed)
Os ternos e casacos evocaram os anos 1970 com padronagens xadrez e texturas felpudas, enquanto camisolas plissadas de organza branca, usadas sobre bodies neon, criavam camadas leves e etéreas. Havia ainda vestidos com inspiração histórica, baseados em vestimentas dos séculos 17 e 18 — parte de um exercício contínuo do estilista em repensar o volume e o modo de vestir, cobrindo o corpo sem necessariamente escondê-lo.
Coleção inverno/primavera 2025 de Herchcovitch; Alexandre (Foto: reprodução/Fernanda Calfat/Getty Images Embed)
Os looks finais, todos em látex, reforçaram essa proposta: vestidos ajustados ao corpo, com recortes estratégicos, criavam tensão entre sensualidade e contenção. Elementos como laços, florais estruturados e parkas neon em acabamentos variados completaram o leque visual. O neon, aliás, foi uma das grandes estrelas da noite — presente não só nas roupas, mas também nos acessórios e na atmosfera do desfile.


Moda como linguagem de liberdade
Ao recusar uma narrativa única ou uma temática fechada, o estilista propôs uma moda que acompanha os tempos atuais: fragmentada, fluida e verdadeira. Misturando desejos, técnicas e referências, Herchcovitch mais uma vez prova que estilo não se resume a tendências — é, sobretudo, uma forma de existir no mundo.