Nesta quarta-feira (10), o Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou o julgamento do decreto de indulto assinado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, que perdoou a pena imposta ao ex-deputado Daniel Silveira, condenado pela Corte em 2022.
A decisão final, com placar de 8 votos a favor e 2 contra, confirmou a maioria formada em 4 de maio que invalidou o perdão concedido por Bolsonaro ao ex-deputado Daniel Silveira, condenado pelo STF em 2022.
Ex-deputado Daniel Silveira. Foto/Reprodução: Pablo Valadares/ Camâra dos Deputados
A ministra Rosa Weber, relatora do caso, teve o apoio de outros sete ministros, incluindo Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Roberto Barroso, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Gilmar Mendes. Por outro lado, os ministros André Mendonça e Nunes Marques votaram a favor da validação do perdão da pena.
A ministra Rosa Weber considerou que houve desvio de finalidade no decreto de indulto de Bolsonaro e que este é inconstitucional. As quatro ações que questionaram o decreto foram propostas pelos partidos Rede, PDT, Cidadania e PSOL e foram julgadas pela Corte.
Na sessão do STF nesta quarta-feira (10), os ministros Luiz Fux e Gilmar Mendes votaram sobre o decreto de indulto presidencial. Gilmar se posicionou contra o perdão da pena e afirmou que não há justificativa ou autorização para o decreto.
“Ou o decreto é obra de uma mente de elevada inteligência jurídica, por recuperar prerrogativa presidencial esquecida pela doutrina do direito público nacional, ou o decreto em exame é peça fadada a ocupar lugar de destaque no museu das estultices normativas”, declarou o ministro.
Execução da sentença
Após a decisão do STF de invalidar o indulto, o ex-deputado Daniel Silveira terá que cumprir a pena de prisão que lhe foi imposta pela Corte. A medida entrará em vigor assim que a ata do julgamento for publicada, processo que geralmente ocorre em alguns dias após o encerramento da sessão.
Após a ata de julgamento ser publicada, o ministro Alexandre de Moraes, relator da ação penal em que Daniel Silveira foi condenado, deverá comunicar a unidade prisional em que o ex-deputado está preso, localizada em Bangu 8, no Rio de Janeiro, sobre a decisão do STF.
Em abril de 2022, o STF condenou o ex-deputado Daniel Silveira a oito anos e nove meses de prisão em regime inicial fechado por ameaças ao Estado Democrático de Direito e aos ministros do Supremo. Além da pena privativa de liberdade, Silveira também recebeu a suspensão dos direitos políticos e multa.
O processo em que Silveira foi condenado transitou em julgado em agosto de 2022, o que indica que não são mais possíveis recursos para contestar a decisão.
Daniel Silveira está em regime de prisão preventiva desde 2 de fevereiro deste ano, por decisão do ministro Alexandre de Moraes, em razão do descumprimento das medidas cautelares impostas pelo Supremo Tribunal Federal, incluindo a proibição de usar redes sociais. Com a derrubada do indulto pelo STF, a prisão de Silveira se tornará definitiva em razão de sua condenação pela Corte.
Silveira terá o prazo da pena descontado do tempo em que já esteve preso preventivamente, seguindo o que é previsto no Código Penal.
Silveira foi condenado devido à publicação de um vídeo em fevereiro de 2021 nas redes sociais, no qual fez xingamentos, ameaças e acusações contra ministros do Supremo. No vídeo, ele utilizou palavras ofensivas contra os magistrados e os acusou de corrupção ao receberem dinheiro por suas decisões. Como resultado, ele foi preso em flagrante por ordem de Alexandre de Moraes.
Após ficar em prisão domiciliar em março de 2021, Alexandre de Moraes revogou a medida em novembro e impôs outras cautelares a Silveira, incluindo a proibição de uso de redes sociais. A Procuradoria-Geral da República (PGR) ofereceu denúncia ao STF contra Silveira pelo caso, que foi julgado pela Corte em 20 de abril de 2022. Ele foi condenado por 10 votos a 1, com Nunes Marques votando pela absolvição e André Mendonça por uma pena menor. Nove magistrados votaram pela pena de oito anos e nove meses de prisão.
Logo após a condenação, o presidente na época, Jair Bolsonaro, emitiu um decreto concedendo perdão constitucional a Silveira. Contudo, esse ato foi contestado pelos partidos Rede, PDT, Cidadania e PSOL junto ao STF, sob a justificativa de que violou princípios constitucionais como a impessoalidade e a moralidade.
Os partidos Rede, PDT, Cidadania e PSOL argumentaram que o perdão concedido a Silveira pelo ex-presidente Jair Bolsonaro violou os princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade, além de ter tido um desvio de finalidade, já que não teria sido editado com o objetivo de atender ao interesse público. A Procuradoria-Geral da República, por sua vez, defendeu a validade do decreto por entender que se trata de um ato político da competência privativa do presidente da República, mas ressaltou que os efeitos do indulto ficam restritos à condenação e não afetam os efeitos secundários, como a inelegibilidade.
Durante a sessão do STF da última quarta-feira (3), a ministra Rosa Weber expressou seu voto e afirmou que o perdão presidencial concedido a Silveira “infringiu a norma e violou princípios constitucionais, produzindo efeitos inaceitáveis para a ordem jurídica”. Para a ministra, o presidente da República, embora tenha agido aparentemente em conformidade com as regras constitucionais, editou um decreto de indulto individual que não estava ligado ao interesse público, mas sim destinado a beneficiar um aliado político de longa data que havia sido condenado criminalmente pelo STF.
Segundo a ministra Rosa Weber, a concessão do perdão a um aliado político por simples afinidade partidária não está em conformidade com os princípios que regem a administração pública, como a impessoalidade e a moralidade. Ela ainda destacou que a medida revelou uma faceta autoritária, pois priorizou os interesses pessoais em detrimento do interesse público.
Após o voto da ministra relatora, os demais ministros do STF se pronunciaram na sessão de quinta-feira (4).
Segundo o ministro André Mendonça, a Constituição confere ao presidente da República a competência de conceder indultos, desde que estejam em conformidade com as regras constitucionais, que incluem a proibição de perdoar condenados por crimes como tortura, tráfico de drogas, terrorismo e crimes hediondos. Ele acrescentou que, no contexto do momento em que o perdão foi concedido, a medida teve o efeito de promover a pacificação, ainda que temporária. Além disso, o ministro mencionou que, após o julgamento que condenou Silveira, houve vozes na sociedade que consideraram a pena excessiva.
Ao votar, o ministro Nunes Marques destacou que a Constituição prevê limites para a concessão de indulto, como nos casos de crimes hediondos, e que cabe ao Judiciário avaliar a sua constitucionalidade. Ele afirmou ainda que o mérito do indulto é uma questão de conveniência e oportunidade do presidente da República.
Por sua vez, o ministro Alexandre de Moraes declarou que o decreto de perdão concedido a Silveira representou um “ataque frontal e direto” ao STF.
O ministro Alexandre de Moraes considerou que o decreto de indulto concedido por Bolsonaro apresentou dois vícios: o primeiro relacionado à limitação constitucional e o segundo ao desvio de finalidade. Ele afirmou que o poder sem limites fere o Estado de direito e que a concessão de indulto, embora seja discricionária quanto ao mérito, está vinculada ao império constitucional. Segundo Moraes, não é admissível que o indulto atente contra a democracia, as cláusulas pétreas e a separação e independência dos Poderes.
Barroso enfatizou que o indulto de Bolsonaro foi feito de forma “inusitada” um dia após a condenação de Silveira pelo STF, o que deixou claro a afronta à Corte e o desrespeito às instituições. O ministro também ressaltou que o decreto foi uma ação política eleitoreira, sem relação com a política criminal, e que houve um desvio de finalidade, pois não visou ao interesse público, mas sim aos interesses pessoais do presidente e do congressista condenado.
Barroso também ressaltou que o conteúdo do discurso de Silveira que levou à sua condenação não pode ser considerado como uma forma de liberdade de expressão, uma vez que continha ameaças de agressão física a um ministro do STF. Ele reforçou que a violação à separação dos Poderes ficou evidente pelo fato de que o indulto foi concedido de forma apressada e com justificativas inadequadas.
De acordo com Barroso, as declarações do ex-deputado não apenas ameaçavam fisicamente um ministro do STF, mas também incentivavam a invasão e fechamento do Supremo e do Congresso Nacional, o que teria sido o “embrião” dos atos ocorridos em 8 de janeiro.
Foto destaque: O bolsonarista Daniel Silveira. Foto: Evaristo Sá – AFP