O Papa Francisco aprovou em 2024 o livro litúrgico “Ordo Exsequiarum Romani Pontificis”, que revisou e modificou profundamente os protocolos fúnebres do líder da Igreja Católica, no Vaticano, e deixou orientações estritas para que seu funeral fosse simples.
Geralmente, essa última vontade é informada pelo papa ao carmelengo, o qual é o cardeal responsável por gerenciar a Igreja, planejar o funeral e convocar o conclave durante a Sede Vacante, que é o período entre a morte do papa e a eleição de um novo pontífice, em que o trono do Vaticano fica vago.
No momento em que um papa morre, o centro do mundo católico para. Todos os cargos dos cardeais são extintos, as eventuais dívidas do papa são zeradas. As únicas posições que permanecem durante a Sede Vacante são aqueles que participam do período de transição.
Antigos e novos protocolos
O objetivo do novo formato da cerimônia fúnebre é comunicar que o papa é um “pastor e discípulo de Cristo”, e não uma pessoa poderosa, como um governante ou chefe político.
O camerlengo iniciou os primeiros ritos do funeral papal nessa segunda-feira (21), logo após a morte de Francisco. O cardeal irlandês Kevin Farrell se certificou da morte do papa, lacrou os seus aposentos na Casa Santa Marta e, conforme dita a tradição, destruiu o anel papal, simbolizando a suspensão do poder pontifício. A partir desse momento, o poder da igreja passa interinamente para as mãos do Sagrado Colégio dos Cardeais.
Diferentemente de outros papas, Francisco não usava o “Anel do Pescador”, o anel de sinete de ouro, símbolo oficial papal, com uma gravura de São Pedro lançando suas redes de um barco e o nome do pontífice inscrito na borda. O papa jesuíta escolheu colocar em seu dedo apenas seu anel de bispo, mais simples e de prata.
Até 1958, a morte papal não era um acontecimento o qual o público tinha acesso. Naquele ano, o médico de Pio XII vazou fotos dos momentos finais e, por isso, foi expulso do Vaticano e da ordem médica. No entanto, foi só quando João Paulo II faleceu, em 2005, que todo o mundo passou a acompanhar a cerimônia fúnebre aberta ao público.
Último desejo de Francisco
As recomendações que o pontífice deixou para o seu funeral foram:
- Um enterro bem simples;
- Um rito mais curto, em que o corpo não passará pelo Palácio Apostólico;
- O caixão será apenas um: de madeira, revestido de zinco.
- O caixão será levado diretamente da capela da Casa Santa Marta para a Basílica de São Pedro;
- O caixão ficará no chão da basílica e não em posição elevada;
- O corpo do papa deverá permanecer dentro do caixão para que o público preste suas últimas homenagens;
- O corpo de Francisco deverá ser enterrado em uma basílica romana única: a de Santa Maria Maggiore (Santa Marta Maior), considerada a maior igreja mariana do mundo;
- Sua tumba será simples e sem adornos, entre a Capela Paulina e a Capela Sforza, com uma única inscrição – “Franciscus”;
- O líder da Igreja Católica será chamado apenas de papa ou bispo de Roma, desprezando outros títulos ou nomes mais longos ou complexos. Mas poderá ser chamado em alguns momentos de Romanus Pontifex, que significa “Romano Pontífice” em latim.
Na tradição secular do Vaticano, o corpo dos papas era colocado em três caixôes, sendo dois de madeira e um de chumbo. Depois, era sepultado na Gruta dos Papas, chamada de Necrópole Vaticana, uma cripta que fica embaixo da Basílica de São Pedro. Ali repousam os restos mortais de mais de 100 papas.
O corpo do Papa Francisco será levado para uma missa de corpo presente na praça São Pedro no próximo sábado (26), às 10h, horário de Roma (5h em Brasília).
As “três estações” do adeus
O livro litúrgico aprovado pelo Papa Francisco estrutura o processo fúnebre papal em três “estações”:
- A primeira estação ocorre logo após a morte do papa, na capela privada do pontífice, onde o Camerlengo confima o óbito. O corpo é embalsamado e colocado dentro de um caixão de madeira, revestido de zinco, para retardar a decomposição do corpo. Dali, o caixão é levado à Basílica de São Pedro.
- A segunda estação ocorre na Basílica de São Pedro, no Vaticano, onde o corpo é exposto ao público em uma estrutura baixa e acontece a Missa Exequial, em homenagem ao líder espiritual da Igreja Católica. Após a missa, o caixão é fechado e iniciam-se as “novendiais”, celebrações de missas por nove dias. O caixão será fechado e prosseguirá para a última estação.
- A terceira estação é o sepultamento, que acontecerá na Basílica de Santa Maria Maggiore, em Roma, considerada o maior santuário à Virgem Maria do mundo cristão ocidental. A igreja tem partes que datam do ano 432 depois de Cristo.
A igreja do coração
Em um documento de 29 de junho de 2022, Francisco escolheu a igreja onde costumava rezar com frequência para seu sepultamento. O papa a visitava especialmente antes e depois das viagens internacionais ou após a alta de uma internação.
“Minha vida e meu ministério sacerdotal e episcopal confiei sempre à Mãe do Nosso Senhor, Maria Santíssima. Por isso, desejo que minha última viagem terrestre termine justamente neste antigo santuário mariano, onde tantas vezes rezei no início e no fim de cada missão apostólica, entregando-lhe minhas intenções com confiança e gratidão”, registrou o Papa Francisco.
Graças aos novos protocolos aprovados pelo Papa, será possível sepultá-lo fora de Roma, o primeiro papa em quase 150 anos a não ser enterrado na Basílica de São Pedro, desde Pio IX (1846-1878), que foi transferido três anos após a sua morte para a Basílica Romana de San Lorenzo fuori le Mura (São Lourenço Fora dos Muros), como desejava.