A Organização Mundial da Saúde (OMS) registrou o “distúrbio de games” como uma doença numa publicação do mês passado, correspondente à versão atualizada da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, geralmente chamada de CID-11. O problema é identificado pelo padrão comportamental ininterrupto de jogar videogames.
O padrão de comportamento é diagnosticado como problemático quando o jogador perde o controle sobre o tempo do jogo, sobre a prioridade dada aos jogos em relação a outras atividades mais importantes, e a decisão de permanecer frente à tela mesmo após consequências negativas. O diagnóstico médico é dado após analisar que a atitude do usuário afeta significativamente as áreas pessoais, familiares, sociais, educacionais e ocupacionais ao longo do período de 12 meses.
“Esse é um problema que já vem ocorrendo há muito tempo, mas que piorou. Hoje, a quantidade de jovens que passam horas e até dias na frente do videogame aumentou muito”, explica Cristiano Nabuco, psicólogo e coordenador do Grupo de Dependências Tecnológicas do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP).
Controle de um console XBox. (Foto: Reprodução/Diego Marin).
Nabuco relata o caso de um paciente que ficou cerca de 55 horas seguidas conectado aos dispositivos. O jovem não se levantava nem mesmo para ir ao banheiro a fim fazer suas necessidades fisiológicas: as fazia sentado no chão de seu quarto, dentro da própria calça. Outros, param de tomar banho, se afastam dos amigos, perdem o emprego e/ou total interesse pelos estudos.
Os profissionais apontam que uma parte chave do problema se encontra no modelo de negócios das empresas desenvolvedoras de games ao divulgar que não é preciso pagar para começar a jogar. Contudo, à medida que os clientes se tornam mais apegados aos jogos, as desenvolvedoras conseguem vender “vantagens”. Por isso, analisam constantemente o comportamento dos usuários e testam novas maneiras para evitar que desliguem ou façam outra coisa.
“Os jogos de hoje não têm mais game-over nem pause. Se a pessoa sai, ela desassiste seu time. Isso pode gerar medo de retaliação e o famoso F.O.M.O. [sigla para a expressão em inglês fear of missing out, ou medo de ficar de fora]. O tempo de vida roubado é terrível”, assume Nabuco.
Foto de destaque: mensagem de “Game Over”. Reprodução/Sigmund.