Miu Miu transforma o avental em símbolo de poder e reflexão sobre o trabalho feminino no verão 2026
Com uma coleção que une estética e crítica social, Miuccia Prada ressignifica o luxo e homenageia as mulheres que sustentam o mundo através do fazer, do cuidar e do criar
A Miu Miu apresentou, no verão 2026, uma coleção que se destaca não apenas pela forma, mas pela profundidade de seu discurso. O desfile conduzido por Miuccia Prada transforma a passarela em um espaço de reflexão sobre esforço, propósito e valor — conceitos que dialogam diretamente com a pergunta central da coleção: qual é a importância do trabalho, e sobretudo, do trabalho feminino?
Mais do que um exercício estético, a proposta de Prada é um manifesto silencioso sobre o fazer — sobre as mãos que costuram, cuidam, limpam e criam, sustentando o mundo com gestos cotidianos e, muitas vezes, invisíveis.
Peça carregada de significados
A narrativa se estabelece logo no primeiro look, desfilado pela atriz Sandra Hüller, com o avental como protagonista. O símbolo do trabalho doméstico e artesanal ganha novo significado: transforma-se em emblema de resistência, dignidade e poder.
O avental, presente em cozinhas, oficinas, ateliês e hospitais, torna-se o símbolo do fazer feminino — uma ponte entre o privado e o público, o utilitário e o estético. Ao trazê-lo para o universo do luxo, Prada questiona a hierarquia das roupas e o que a sociedade escolhe valorizar.
O trabalho, em sua forma mais pura, é apresentado como ato de resistência e criação. A coleção celebra o gesto, o processo e o esforço, transformando a moda em espaço de reconhecimento e dignidade. Em tempos em que o luxo busca novos significados, o olhar de Prada aponta para o real: para as mãos que constroem, lavam, costuram, cozinham e cuidam.
Atriz Sandra Hüller no desfile Miu Miu verão 2026 (Foto: reprodução/Getty Imagens Embed/Peter White)
Entre o utilitário e o poético
Na passarela, o avental assume múltiplas identidades. Bordado com cristais, confeccionado em renda, lona crua ou couro industrial, ele revela a dualidade entre fragilidade e força, entre leveza e rigidez, entre o gesto de cuidar e o de criar. Cada versão carrega uma história — uma memória ancestral do trabalho feminino, muitas vezes não contada, mas essencial para a sustentação do mundo.
Desfile Miu Miu verão 2026 (Foto: reprodução/Getty Imagens Embed/ Victor Virgile)
As referências às fotógrafas Dorothea Lange e Helga Paris, conhecidas por documentar a dignidade do cotidiano, reforçam o caráter político da coleção. Assim como suas imagens eternizam a beleza nas mãos calejadas e nos rostos marcados pelo tempo, Prada traduz essa estética em tecidos e cortes que homenageiam o real. A passarela torna-se um espelho da vida — e o luxo, um espaço de crítica e empatia.
Ao reconfigurar o lugar do avental, Miuccia Prada também propõe um novo tipo de glamour: aquele que nasce da imperfeição e do esforço. O luxo não está mais na opulência, mas na autenticidade; não na ostentação, mas no reconhecimento do humano. O avental, esse objeto cotidiano e aparentemente banal, transforma-se em símbolo de poder silencioso, uma bandeira da resistência feminina através do tempo.
Desfile Miu Miu verão 2026 (Foto: reprodução/Getty Imagens Embed/ Peter White)
Um gesto revolucionário
No fim, o desfile da Miu Miu é mais do que uma coleção — é uma homenagem. Uma celebração das mulheres que, com trabalho e cuidado, sustentam lares, comunidades e indústrias. O avental, agora elevado à categoria de luxo, é o instrumento de uma revolução simbólica: a valorização do fazer feminino como gesto de arte e sobrevivência.
Em uma era em que a moda busca sentido, Miuccia Prada oferece uma resposta poderosa: reconhecer o trabalho — e principalmente o trabalho das mulheres — como o verdadeiro fundamento da beleza. Se o avental é hoje um objeto de desejo, talvez o gesto mais transformador seja enxergar, enfim, o valor de quem sempre o vestiu.
