Ney Matogrosso ressignifica a moda e desafia convenções há cinco décadas

Além da escola de samba carioca Imperatriz Leopoldinense homenagear Ney Matogrosso no carnaval de 2026, e o filme Homem com H alcançar R$13 milhões de bilheteria, alcançando a marca histórica de 600 mil espectadores, é importante destacar os figurinos mais marcantes do cantor no decorrer da sua trajetória musical.  A seguir, os visuais mais emblemáticos […]

01 jul, 2025
Foto destaque: Ney Matogrosso em figurino icônico repleto de brilhos e penas, representando sua estética teatral e provocadora (Reprodução/Pinterest/@Epoca)
Foto destaque: Ney Matogrosso em figurino icônico repleto de brilhos e penas, representando sua estética teatral e provocadora (Reprodução/Pinterest/@Epoca)
Imagem de Ney Matogrosso usando traje metálico e cocar decorado, símbolo de sua ousadia visual nos palcos.

Além da escola de samba carioca Imperatriz Leopoldinense homenagear Ney Matogrosso no carnaval de 2026, e o filme Homem com H alcançar R$13 milhões de bilheteria, alcançando a marca histórica de 600 mil espectadores, é importante destacar os figurinos mais marcantes do cantor no decorrer da sua trajetória musical.  A seguir, os visuais mais emblemáticos que atravessaram décadas, refletindo estética, performance e contestação.

Secos & Molhados (1971–1974)

Ney irrompeu nos palcos com o grupo Secos & Molhados, adotando maquiagem dramática e adereços tribais como colares de contas e dentes, penas, braceletes cilíndricos e até um “tapa-sex” com crina, criando um visual teatral e subversivo em plena ditadura militar. Esse figurino inaugurou sua identidade: ousado e politicamente engajado.


Figurino e maquiagem dos Secos e Molhados (Foto: reprodução/Pinterest/@AlessandraSilva)


Mais do que um mero elemento visual, essa estética causava estranhamento e encantamento ao mesmo tempo, desafiando noções rígidas de masculinidade e introduzindo a androginia como parte da linguagem de palco. Ney usava o corpo como extensão da música, com gestos que transformavam cada performance em um ato de resistência simbólica.

Águas do Céu / Homem de Neanderthal (1975)

Em sua estreia solo, Ney encarnou um “homem-pássaro”, usando pelos, chifres e pintura corporal, fundindo ancestralidade primitiva com sensualidade. Essa persona bestial reforçou sua proposta estética original e provocadora.


Maquiagem e figurino de Águas do Céu/Homem de Neandertal (Foto: reprodução/Ney Matogrosso)


Os trajes, embora minimalistas em tecido, eram maximalistas em conceito. Ele propunha um retorno ao instintivo, ao corpo naturalizado e ritualístico, questionando as normas sociais que o vestuário impõe. Através da pele exposta, Ney evidenciava a potência do corpo como território de expressão artística.

Bandido (1976)

Durante o show Bandido, ele operacionalizou sua androginia urbana, misturando elementos masculinos e femininos em looks que exploravam o corpo como linguagem, com peças em couro, transparências e cenários teatrais.


Figurino e maquiagem da era Bandido (Foto: reprodução/Ney Matogrosso)


Essa fase marcou um ponto de virada, no qual Ney transitava entre o marginal e o sofisticado. As roupas refletiam um espírito libertário, por vezes punk, que dialogava com a metrópole e a efervescência política da época. Era o artista se reposicionando em meio às tensões sociais do país.

Homem com H (1981)

Durante o lançamento do álbum de 1981, que trazia a emblemática faixa “Homem com H”, Ney Matogrosso consolidou seu visual urbano androginizado. Nesse período, ele transitava por um figurino que misturava sofisticação cosmopolita e elementos transgressores: peças em couro, transparências sutis e cortes minimalistas, sempre realçando o corpo como linguagem performática. A estética refletia a transição do artista do contexto marginal para palcos metropolitanos, numa intersecção de elegância punk e contestação sociocultural.


Apresentação de Homem com H no Fantástico, em 1981 (Vídeo: reprodução/Youtube/@VideotecadoJota)


Visualmente, Ney abraçou uma estética que rompia com padrões: camisas estruturadas, calças justas e detalhes provocativos que flertavam com a moda masculina tradicional, mas que eram carregados de sensualidade e ambiguidade. Esse figurino urbano‑andrógeno permitiu-lhe seguir se posicionando como figura provocadora em plena ditadura, reforçando sua identidade artística em meio ao sucesso comercial do disco. A era “Homem com H” foi, portanto, um marco estético que consolidou seu papel como precursor da androginia performática no Brasil.

Festival dos Festivais (1985)

No icônico evento, Ney apareceu apenas com uma tanga de penas e miçangas, glitter e uma penugem na cabeça, evocando ancestralidade indígena e teatralidade, e consolidando sua presença performática.


Ney Matogrosso no Festival dos Festivais (Foto: reprodução/Pinterest/@TVGlobo)


O impacto desse visual foi imediato: causou polêmica, fascínio e foi amplamente comentado na mídia. Ao se apresentar com tamanha vulnerabilidade física e ao mesmo tempo com tamanha força cênica, Ney reafirmava que o corpo, mesmo quase nu, podia ser armadura, protesto e arte.

Atento aos Sinais (2013)

Na turnê “Atento aos Sinais”, Ney surgiu com macacões metalizados feitos por Ocimar Versolato, Milton Cunha e Marta Reis. Eram peças coladas ao corpo, carregadas de brilho, turbantes, franjas e adereços, que ressaltavam seu legado teatral e futurista.


Ney Matogrosso em turnê Atento aos Sinais (Foto: reprodução/Pinterest/@Letras.mus.br)


Com esse figurino, Ney reafirma que a maturidade não é sinônimo de contenção. Ao contrário: seus 70 anos vieram acompanhados de mais audácia e brilho, provando que sua estética evolui sem perder a essência. O corpo em cena segue sendo ferramenta de transformação e poesia.

Bloco na Rua (2019–)

Nesta turnê mais recente, assinada por Lino Villaventura, o cantor veste uma “pele dourada”: um macacão-armadura metálica com cristais, capuz, pássaros nos punhos e pés, peça que, ao revelar seu rosto no palco, emociona e impacta.


Figurino dourado da turnê Bloco na Rua (Foto: reprodução/Ney Matogrosso)


O figurino funciona quase como um escudo luminoso, transformando Ney em um ser místico e contemporâneo. A escolha por uma peça única, estruturada e brilhante carrega simbologia: é a união do sagrado com o pop, da idade com a vanguarda. Ney segue desafiando o tempo, o gênero e a forma.

Um olhar reflexivo

Cada figurino de Ney Matogrosso foi concebido para não apenas encantar, mas para comunicar: sejam ancestrais, futuristas, eróticos ou políticos, seus visuais transformam cada performance em manifesto. Como ele mesmo define, “o figurino me mostra nu”, criando um personagem que protege e o revela ao mesmo tempo.

Seus visuais atravessaram o teatro, a moda, a identidade de gênero e a resistência artística. Tanto que museus e exposições, como as do Senac e MIS, mantêm acervos de suas peças, algumas com mais de 220 itens, preservando sua marca na cultura brasileira.



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