Conhecida como Dona de Lurigancho, Juana Lazo Díaz, é uma lenda na temida prisão da América Latina. Seu apelido é cobiçado pelos criminosos mais experientes, que gostariam de ter a mesma reputação no submundo. No entanto, Juana nunca praticou furto de celulares, bolsas ou qualquer outro objeto, nunca ameaçou ninguém com armas ou facas, nem sequer cometeu o pequeno delito de comer uvas ou biscoitos no supermercado. Ela tem um forte senso de propriedade e respeito pelo que pertence aos outros.
Juana Lazo Díaz caminha com uma bengala até sua casa, localizada dentro da prisão no Peru, em 27 de abril de 2023. Foto/Reprodução: Angela Ponce/ El Pais
Desde 1966, Juana Lazo Díaz reside em uma ampla residência de 250 metros quadrados localizada no alto de uma colina a leste de Lima. Seu pai ocupou a casa com sua família na época em que foi cogitada a construção de um estabelecimento prisional em uma região semidesértica, com o objetivo de aliviar a superlotação de outras prisões na capital. Anteriormente, a família havia residido na lendária Colônia Penal Agrícola (CEPA) na selva de Ucayali. Quando surgiu a oportunidade de o pai assumir o cargo de chefe de manutenção na nova prisão, isso pareceu uma oportunidade imperdível. Especialmente porque havia uma casa grande ao lado, construída por antigos proprietários de terras para monitorar a área.
A casa em questão, cujas janelas agora estão cobertas de plástico e um toldo desbotado balança ao longe com a força do vento, é onde a história de vida de Juana Lazo se desenrolou. Foi lá que ela cresceu com seus pais e oito irmãos, aprendeu a lidar com a epilepsia que a acompanha desde sempre, concluiu seus estudos escolares, frequentou a universidade, deu à luz dois filhos, envelheceu, desenvolveu varizes e, há alguns anos, tornou-se bisavó. Muitas festas foram organizadas na casa ao longo dos anos, com a pachamanca sendo a atração principal: uma refeição típica dos Andes em que a carne é cozida no subsolo com pedras pré-aquecidas.
No entanto, as festas e reuniões chegaram ao fim em 1996. Naquele ano, a superlotação na prisão de Lurigancho atingiu níveis incontroláveis e a instalação de mais pavilhões se tornou uma emergência. Originalmente projetada para abrigar 2.500 internos, a prisão acabou recebendo mais de 10 mil detentos. Atualmente, o número de presos registrado é de 9.053.
Para ganhar mais espaço, o Instituto Penitenciário Nacional ordenou a expansão do perímetro da prisão. Para sua surpresa, a casa da família de Juana foi incluída na área expandida e eles confundiram sua localização. Juana acredita que isso foi uma vingança da Guarda Republicana, a unidade policial responsável pela segurança da prisão, por ter testemunhado um motim em 1983, que resultou no assassinato de uma freira e oito detentos. Desde então, há 27 anos, a situação de Juana Lazo se tornou uma excentricidade: ela vive dentro de uma prisão, mas não é uma detenta. Como muitos outros, ela está “presa” sem ter cometido nenhum crime, mas seu caso é um exemplo extremo de injustiça.
Juana Lazo Díaz relembra como ficou sozinha na casa depois que sua família decidiu sair do local por medo da situação na prisão. Ela enfatiza que seu pai conquistou a casa com dignidade e, por isso, decidiu permanecer lá. Atualmente, ela costuma se sentar em uma das barracas de comida em frente ao presídio.
Na tarde de quinta-feira, há uma agitação no presídio devido ao dia de visitas. Na maioria das vezes, são mulheres que chegam, incluindo mães, filhas, irmãs, esposas e namoradas, que trazem consigo pacotes com guloseimas, produtos de higiene pessoal e outros itens para os presos. Todos passam por uma revisão rigorosa na entrada, exceto Juana Lazo, que possui uma permissão especial concedida pelo diretor da prisão que lhe permite entrar e sair livremente do local quando quiser.
Nem no Natal, nem em outras datas importantes. Ela se vê sozinha em sua casa, no meio de um presídio superlotado, sem a presença de seus entes queridos para lhe fazer companhia.
Juana Lazo brinca com um sorriso divertido no rosto que seu aniversário cai no Dia dos Namorados, o que lhe permite entender o que é o amor, mesmo que não queira nenhum amor por si mesma.
Juana Lazo enfrenta outras dificuldades além da solidão, como ter que subir e descer o morro onde sua casa fica todos os dias. Se a porta da garagem estiver fechada, ela precisa fazer isso pela entrada principal, o que leva cerca de 25 minutos e já a fez cair várias vezes. Além disso, ela não faz compras e não possui geladeira, tomando café da manhã e almoçando na casa de uma amiga que a trata como mãe e recebe uma pequena quantia por isso. Apesar de estar há anos na casa, o Instituto Penitenciário Nacional (Inpe) entrou com dois processos de despejo contra ela, alegando ser dono do imóvel. Juana não possui título de propriedade, tendo herdado a casa por transferência de posse. Atualmente, um advogado está auxiliando-a ad honorem em seu caso.
Mesmo com toda a dificuldade que enfrenta, Juana Lazo mantém um sorriso no rosto e conta piadas que lembra de memória. Ela é conhecida como a Dona de Lurigancho e carrega consigo documentos, recortes de jornal que contam sua história e fotos de sua vida passada. Para ela, tudo o que pede é um lugar confortável para passar seus últimos anos. Se o Estado não puder fornecê-lo, ela acredita que seria justo receber uma indenização pelos maus-tratos sofridos apenas por ser vizinha do presídio de Lurigancho. De acordo com seu advogado, ela teria um crédito de 300 mil soles (cerca de R$ 400 mil).
A Dona de Lurigancho é uma senhora simpática e engraçada que conta piadas e faz rimas sobre os ex-presidentes do Peru. Ela também filosofa sobre a criação do mundo e das mulheres, enquanto ouve música em um velho rádio. No entanto, ela ainda tem que voltar para a cadeia quando o sol se puser, como faz todos os dias. Apesar de sua disposição alegre, ela tem uma necessidade urgente: um refrigerante, por favor.
Foto destaque: Juana Lazo Díaz em sua casa na prisão de Lurigancho. Foto/Reprodução/El Comercio