Simone Bellotti reinterpreta o minimalismo na estreia da Jil Sander em Milão

A estreia de Simone Bellotti à frente da Jil Sander, apresentada nesta terça-feira (24), durante o segundo dia da Milão Fashion Week, partiu da reflexão sobre como inserir sua identidade em uma marca conhecida por reduzir e subtrair. Essa resposta se materializou em roupas que, embora respeitem o legado da fundadora, trazem nuances pessoais e contemporâneas.

O legado de Jil e a herança purista

Jil Sander nunca quis ser rotulada como “rainha do minimalismo”. Preferia ser chamada de “purista”, enfatizando a forma, a técnica e a matéria-prima, e não apenas o efeito final. Essa busca pela essência continua sendo a espinha dorsal da marca — e foi justamente esse vocabulário que Bellotti escolheu como base para sua estreia. Em vez de se afastar do passado, o designer italiano decidiu revisitá-lo, adicionando camadas que ampliam a narrativa original.

Bellotti partiu desse vocabulário para construir sua coleção: linhas limpas, silhuetas estruturadas e uma alfaiataria aparentemente simples, mas repleta de detalhes arquitetônicos. Uma saia lápis ganha interesse nas pequenas ancas pontiagudas dos quadris; um vestido básico se reinventa com recortes laterais; e uma malha cropped traduz ausência e subtração. O desfile se apresentou quase como uma aula de matemática — onde equações se transformam em roupas.


Desfile da marca Jil Sander (Foto: reprodução/Gamma-Rapho/Victor VIRGILE/Getty Imagens Embed)


Traços esportivos na alfaiataria

A herança esportiva da marca também esteve presente, sugerindo movimento e energia urbana. Mas Bellotti acrescentou delicadeza e emoção, numa clara lembrança da passagem de Raf Simons pela grife. Silhuetas que acentuam a cintura, tecidos que insinuam romance e uma cartela de cores que equilibra cinzas e pretos com laranja, azul-anil e roxo-berinjela reforçam essa dualidade entre rigor e sentimento. Essa mistura mostra que o essencial pode ser ao mesmo tempo racional e afetivo, trazendo sofisticação e humanidade à coleção.


Desfile da marca Jil Sander (Foto: reprodução/Vittorio Zunino Celotto/Getty Imagens Embed)


Minimalismo como escape

Talvez o gesto mais simbólico tenha sido a inclusão do jeans, tratado não como elemento casual, mas como peça carregada de significado. Em um mundo saturado de estímulos visuais, vestir-se de forma elementar soa como um ato de resistência. O minimalismo, aqui, não é apenas estética, mas uma proposta de escape, um retorno ao que realmente importa. Bellotti parece compreender que a moda contemporânea precisa oferecer espaço para respirar — e a Jil Sander, sob sua condução, se posiciona como refúgio de clareza em meio ao excesso.


Desfile da marca Jil Sander (Foto: reprodução/Vittorio Zunino Celotto/Getty Imagens Embed)


O futuro da Jil Sander sob a visão de Bellotti

A estreia de Simone Bellotti não foi apenas um exercício de continuidade, mas um gesto estratégico que aponta para onde a marca pode caminhar nos próximos anos. Ao mesmo tempo em que honra o legado purista de Jil, baseado na precisão técnica e na obsessão pela forma, Bellotti insere uma camada de emoção e humanidade que reposiciona a grife diante de um cenário global cada vez mais acelerado.

Essa leitura contemporânea do minimalismo sugere uma ruptura sutil, mas poderosa: se nos anos 1990 a simplicidade era um manifesto de disciplina, hoje ela se transforma em ferramenta de escape, um antídoto contra o excesso de estímulos visuais e tendências descartáveis. Bellotti entende que a clareza não precisa ser fria, que a pureza pode ser também afetiva, e que a moda essencial tem espaço para narrativa, romance e movimento.

Ao unir rigor arquitetônico e delicadeza emocional, o designer sinaliza um novo capítulo para a marca alemã — um minimalismo que dialoga com o caos do presente, oferecendo refúgio, sofisticação e relevância. Nesse sentido, a estreia de Bellotti não apenas reforça a identidade da Jil Sander como também a reposiciona no mapa global da moda.