Em última ação no STF, Barroso vota por descriminalizar aborto para gestações de até 12 semanas
Ministro junta-se a Rosa Weber que também posicionou-se sobre a questão às vésperas da aposentadoria; constituindo 2 votos na Corte para que o procedimento
O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, decidiu retomar ontem (17), em seu último dia antes de deixar na Casa, a votação acerca da descriminalização do aborto, iniciada em 2023 pela ministra Rosa Weber também logo antes de sua aposentadoria. Assim como Weber, Barroso votou para que a prática não seja mais considerada criminosa em casos de gestações de até 12 semanas.
Na ocasião, Barroso cancelou o pedido de destaque que fizera em 2023 (quando era presidente do STF), transferindo, na época, o julgamento do processo do plenário virtual para o plenário físico. Logo após a manifestação do seu voto, virtualmente, o ministro Gilmar Mendes retransferiu a votação para o meio presencial, sem prazo para que seja efetuada.
A atitude de Barroso coincide com a tentativa, no Senado, de proibir a interrupção voluntária de gravidezes de mais de 22 semanas, mesmo em casos já previstos em lei (risco à vida da gestante ou gravidez resultante de estupro, por exemplo).
O ministro, que presidiu a Corte Constitucional brasileira por 2 anos, até setembro de 2025, anunciou na quinta-feira passada (9) seu pedido de aposentadoria, formalizado na segunda (13). Ontem, sexta (17), foi seu último dia como membro do STF.
Durante o anúncio, Barroso esclareceu que já informara o presidente acerca de sua decisão há dois anos e que, portanto, não há relação direta com os fatos do momento, em referência às restrições impostas pela administração Trump aos integrantes da Casa devido ao julgamento e posterior condenação do ex-presidente, Jair Bolsonaro, pela trama golpista.
‘Se homens engravidassem, aborto não seria crime’
Em seu voto, o jurista afirmou que a questão deve ser vista como de saúde pública, não de direito penal.
“Ninguém é a favor do aborto em si. O papel do Estado e da sociedade é o de evitar que ele aconteça, dando educação sexual, distribuindo contraceptivos e amparando a mulher que deseje ter o filho e esteja em circunstâncias adversas. Deixo isso bem claro para quem queira, em boa-fé, entender do que se trata verdadeiramente. A discussão real não está em ser contra ou a favor do aborto. É definir se a mulher que passa por esse infortúnio deve ser presa”, acrescentou.
Professor de Direito Constitucional da UERJ, Barroso atende um congresso acadêmico em 2024 (Foto: reprodução/Bruno Escolastico Sousa Silva/Getty Images Embed)
Para ele, as grandes penalizadas pela atual conjuntura são meninas e mulheres pobres, já que a classe média e alta pode se deslocar para outros países ou obter outros meios de realizar o procedimento. Ele ainda colocou a interrupção como um direito feminino.
“As mulheres são seres livres e iguais, dotadas de autonomia, com autodeterminação para fazerem suas escolhas existenciais. Em suma: têm o direito fundamental à sua liberdade sexual e reprodutiva. Direitos fundamentais não podem depender da vontade das maiorias políticas. Ninguém duvide: se os homens engravidassem, aborto já não seria tratado como crime há muito tempo”, concluiu.
Votação foi iniciada em 2023 por Rosa Weber, a pedido do PSOL
Com essa atitude, o magistrado reproduz o comportamento da ex-ministra Rosa Weber, que, em 2023, às vésperas de sua aposentadoria, decidiu colocar em discussão a descriminalização do aborto. O STF mantém o voto de ex-membros desde que esse seja realizado enquanto o ministro estiver formalmente na Corte.
O tema foi levantado pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) em 2017, que, baseando-se nos preceitos fundamentais da dignidade da pessoa humana, cidadania, não discriminação, inviolabilidade da vida, liberdade, igualdade, proibição de tortura ou tratamento desumano ou degradante, saúde, entre outros, todos presentes na Magna Carta brasileira, apontou a proibição do procedimento como inconstitucional.
Em 2023, foi o próprio Barroso que deslocou a votação do plenário virtual para o físico, suspendendo, na prática, a continuidade dos votos. Com seu recente posicionamento, contudo, já são 2 votos, de ao menos 6, para que o aborto seja, em tese, descriminalizado no Brasil, embora a pauta enfrente forte rejeição no Legislativo.
