Suprema Corte dos EUA avalia recurso que pode ameaçar casamento entre pessoas do mesmo sexo

Na sexta-feira (7), a Suprema Corte dos Estados Unidos se reuniu para examinar um recurso que pode ter impacto profundo sobre o reconhecimento legal de uniões entre pessoas do mesmo sexo.  O caso foi apresentado pela ex-funcionária pública do condado de Rowan, no estado de Kentucky, Kim Davis, que se recusou a emitir licenças de casamento após a histórica decisão da corte de 2015, no caso de Obergefell v. Hodges, que garantiu o direito ao casamento para casais do mesmo sexo em todo o país. 

Naquele julgamento de 2015, a maioria da Suprema Corte reconheceu que a Constituição dos EUA protege o direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, o que levou a celebrações em frente ao prédio da corte e a centenas de milhares de casamentos realizados posteriormente.  Entretanto, Davis que então ocupava o cargo de escrivã no condado citou objeção religiosa para negar licenças e foi processada, condenada ao pagamento de indenizações e chegou a ser presa por desobedecer ordem judicial.

O recurso movido por Davis pede à corte não apenas que analise sua situação pessoal, isto é, que seja absolvida de responsabilidade sob argumento de liberdade religiosa, mas também que reconsidere o precedente Obergefell. Embora muitos especialistas considerem improvável que a corte volte atrás, o fato de o recurso ter sido admitido gera preocupação entre ativistas LGBT+.

Cenário mais conservador

Do ponto de vista institucional, a atual composição da Suprema Corte revela um cenário mais conservador do que o que existia em 2015. O juiz decisivo na época, Anthony Kennedy, aposentou-se em 2018; sua substituição pelo juiz Brett Kavanaugh, e a nomeação da juíza Amy Coney Barrett em lugar da juíza liberal Ruth Bader Ginsburg reforçam uma maior inclinação conservadora.

Ao mesmo tempo, o princípio do stare decisis ou seja, a doutrina jurídica que prescreve que precedentes devem ser respeitados é um fator de peso para que a corte rejeite revisitar decisões consolidadas. O juiz Samuel Alito, que discordou de Obergefell, afirmou que o precedente “merece o respeito conferido pela doutrina do stare decisis”.

Para decidir se aceita ou rejeita o recurso, a corte considera diversos critérios, incluindo o grau de dependência que a sociedade desenvolveu sobre o precedente.

No caso do casamento entre pessoas do mesmo sexo, fatores como direitos de guarda de filhos e planejamento financeiro entram nessa avaliação.  Outro aspecto relevante é quantos juízes estão dispostos a ouvir o caso e, no final, votar pela sua procedência, são necessários quatro votos para admitir o recurso, mas para reverter o precedente, cinco votos são requeridos.

Cenário pode parecer desfavorável

Ainda que o cenário pareça desfavorável à reversão completa da decisão de 2015, o simples fato de o recurso estar em análise reacendeu temores de que a proteção jurídica para casais do mesmo sexo possa ser enfraquecida ou colocada em risco.
Um dos alertas partiu de James Obergefell, o autor da ação original de 2015 que leva seu nome ao afirmar: “Neste momento, não confio na Suprema Corte”.

Caso a corte decida não admitir o recurso, ele será arquivado e o precedente mantido sem novo julgamento. Se for admitido, poderá haver análise sobre a questão técnica referente à responsabilidade de Davis ou, mais amplamente, uma revisão sobre o direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo.





 

 

 

 

 

 


Recurso movido por Kim Davis, pede anulação do casamento homoafetivo nos EUA (Vídeo: reprodução/YouTube/CNN Brasil)


O julgamento, portanto, está sendo acompanhado com atenção internacional não apenas pela comunidade LGBT+ dos EUA, mas pelos observadores de direitos humanos globalmente, dado o papel simbólico e efetivo dos EUA em pautar direitos civis em outras jurisdições. A decisão final, esperada em breve, poderá tanto encerrar a incerteza quanto instalar um novo período de debate jurídico e social.