Caso Rubens Paiva: STF formou maioria para discutir se a Lei da Anistia se aplica a “crimes permanentes”

Na última sexta-feira (14) os ministros do STF decidiram analisar se a Lei da Anistia contempla os crimes de ocultação de cadáver cometidos durante a ditadura militar que permanecem sem solução até hoje. A deliberação foi em plenário virtual e os ministros têm até amanhã, sexta-feira (21), para se manifestarem. O relator é o ministro Alexandre de Moraes, alcançou maioria dos ministros para julgar a ação e analisa o caso do ex-deputado federal Rubens Paiva e seu desaparecimento forçado. 

Além do ministro Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso, Flávio Dino, Edson Fachin, Cristiano Zanin e Nunes Marques foram favoráveis para julgar esta ação que envolve a morte de Paiva e de outras duas vítimas: Mário Alves de Souza Vieira, fundador do PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário) e de Helber José Gomes Goulart, militante da Aliança Libertadora Nacional (ALN). Crimes permanentes são aqueles que envolvem graves violações aos direitos humanos, como tortura e desaparecimento forçado, por exemplo. Os efeitos destes crimes persistem ao longo do tempo, afetando, continuamente, as vítimas e seus familiares.

A discussão é se os acusados pela prática destes crimes podem ser processados e punidos mesmo após anistiados pela Lei de Anistia de 1979. Caso seja favorável, a decisão, abrirá precedentes para julgamento de casos semelhantes.

Repercussão geral

O ex-deputado federal Rubens Paiva teve seu desaparecimento forçado em 1971, durante a ditadura militar brasileira e nunca mais foi encontrado. 


Ex-deputado federal Rubens Paiva (Foto: reprodução/Arquivo pessoal)

Apesar da ação do STF estar voltada para os casos de Paiva, Vieira e Goulart ela tem repercussão geral, ou seja, vai além destes casos, impactando diversos outros parecidos em todo o país. Isto é válido para evitar que o STF analise cada caso individualmente, podendo aplicar a decisão em outros processos da mesma natureza. 

Necessidade da discussão 

O ministro Alexandre de Moraes defendeu a necessidade de se rediscutir a anistia brasileira para crimes cometidos durante a ditadura militar, inclusive, porque outros países da América Latina estão promovendo debates sobre esta legitimidade. Entre eles, Argentina e Chile. 

Outro ponto levado em consideração pelo ministro são os crimes cometidos por agentes públicos a pretexto de combater os dissidentes e que nestes países, também, estão sendo revistos.

Segundo o ministro Alexandre de Moraes, a Lei da Anistia levou à  “impunidade para agentes públicos que praticaram atos de extrema gravidade contra a vida e a liberdade”. 

 A decisão desta ação, a ser deliberada pelos ministros do STF até sexta-feira (21), pode ter um impacto significativo nas discussões sobre justiça e reparação histórica no Brasil.

Certidão de óbito de Rubens Paiva é corrigida para ‘morte violenta causada pelo estado’

A certidão de óbito de Rubens Paiva, engenheiro e ex-deputado federal assassinado pela ditadura foi corrigida nesta quinta-feira (23). A atualização veio 29 anos depois de sua esposa, a advogada Eunice Paiva (1929-2018), conseguir a declaração oficial de óbito do marido, em 1996.

De acordo com a nova declaração, o político morreu de forma violenta causada pelo estado.

Procedo a retificação para constar como causa da morte de RUBENS BEYRODT PAIVA, o seguinte: não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro no contexto da perseguição sistemática à população identificada como dissidente política do regime ditatorial instaurado em 1964 e para constar como atestante do óbito: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP)

Comunica o novo trecho do documento.


Nova certidão de óbito de Rubens Paiva (Reprodução/CEMDP)

Resolução do CNJ

Os cartórios estão cumprindo uma resolução do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), de 13 de dezembro do ano passado, para que sejam corrigidas ou lavradas as certidões de óbito de pessoas assassinadas pela Ditadura Militar.

A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) deverá realizar as entregas dos documentos em solenidade com pedidos de desculpas e homenagens.

Através da resolução, as certidões de óbito de 202 pessoas serão atualizadas, enquanto os 232 desaparecidos durante o regime militar terão direito a um atestado de óbito. Este número de 434 mortos foi reconhecido pela Comissão Nacional da Verdade que, entre 2012 e 2014 revelou crimes contra os direitos humanos cometidos pela ditadura militar.

Com a apresentação do relatório final da comissão, o Brasil reconheceu diversos crimes, como detenções ilegais e arbitrárias, tortura, violência sexual e execuções e outras formas de agressões realizadas por integrantes da ditadura.

“Ainda Estou Aqui”

Também nesta quinta-feira (23), o longa-metragem brasileiro que retrata a jornada de Eunice Paiva até conseguir a certidão de óbito do marido recebeu 3 indicações ao Oscar. O filme concorre às categorias de Melhor Atriz (Fernanda Torres), Melhor Filme Internacional e Melhor Filme.

A obra adapta o livro homônimo, escrito por Marcelo Rubens Paiva, filho de Eunice e Rubens Paiva. Dirigido por Walter Salles, a obra já realizou grandes feitos em festivais de cinema, sendo aplaudido por quase 10 minutos após sua estreia no Festival de Veneza e conquistando o Globo de Ouro de melhor atriz em filme de drama com Fernanda Torres

“Ainda Estou Aqui” alcança marca de 2 milhões de espectadores

Filme brasileiro que pode estar na premiação do Oscar, “Ainda Estou Aqui” segue fazendo história no Brasil. O longa, que estreou no dia 7 de novembro nos cinemas, atingiu a marca de dois milhões de espectadores em menos de um mês em exibição. A obra está perto de superar o filme “Minha irmã e eu” como o filme mais visto no Brasil desde a pandemia da Covid-19.

Líder de bilheteria

Apesar de grandes produções estrangeiras, o filme brasileiro está na liderança de bilheteria da última semana. A produção estrelada por Fernanda Torres ultrapassou o longa “Wicked”, tornando-se o mais visto da última semana nos cinemas por todo o Brasil. “Ainda Estou Aqui”, com sua popularidade, também ficou na frente de “Gladiador 2”, sequência do clássico filme de 2000.


Elenco de “Ainda Estou Aqui” no 81º Festival de Veneza (Foto: reprodução/Instagram/@sonypicturesbr)

Além disso, “Ainda Estou Aqui”, tornou-se o filme dirigido por Walter Salles com maior público nos cinemas brasileiros. A marca foi atingida entre os dias 21 e 24 de novembro. No último final de semana, conforme dados do Comscore, o filme arrecadou R$ 8,9 milhões e um público de 390 mil pessoas. Antes, o filme de maior sucesso do diretor era o clássico “Central do Brasil”, que teve 1,6 milhões de espectadores entre 1998 e 1999.

Uma história do Brasil

“Ainda Estou Aqui” é uma adaptação do livro homônimo e autobiográfico do jornalista Marcelo Rubens Paiva. A obra conta a história de seu próprio pai, Rubens Paiva, um deputado federal que foi preso, torturado e morto pela ditadura militar em 1971, no Rio de Janeiro.


Walter Salles e Fernanda Torres durante gravações de “Ainda Estou Aqui” (Foto: reprodução/X/ @mahteocosta)

A trama conta como Eunice Paiva, mãe de Marcelo Rubens Paiva, precisa mudar totalmente sua rotina após o marido ser exilado. Ela se vê obrigada a tornar-se ativista dos direitos humanos após o desaparecimento do marido durante o regime de exceção que imperou no Brasil entre 1964 e 1985.

Entenda o impacto do AI-5 na história do Brasil

O Ato Institucional n.º 5 (AI-5) foi um decreto assinado pelo presidente Arthur da Costa e Silva em dezembro de 1968, quatro anos depois do golpe militar de 1964. Este ato é reconhecido como o mais rigoroso do regime militar e sinalizou o começo dos “anos de chumbo”.

Delfim Netto, um dos signatários, faleceu nesta segunda-feira (12). Na época, o Ato Institucional n.º 5 foi justificado como uma medida essencial para “proteger os ideais da Revolução (de 1964)” que estariam sendo “ameaçados” por “atos abertamente subversivos”.


AI-5 promulgado em 1968 (foto: reprodução/Instagram/@diário do nordeste)

AI-5: Repressão e Abertura Política no Brasil (1968–1979)

O AI-5, vigente de 13 de dezembro de 1968 a 1º de janeiro de 1979, estabeleceu 12 artigos que restringiram direitos individuais e intensificaram a repressão. Sua revogação ocorreu durante o governo de Ernesto Geisel, como parte do processo de abertura política que levou ao restabelecimento da democracia.

Entre 1946 a 1988 foram contabilizados 434 mortes e desaparecimentos, a maioria durante o regime militar, de acordo com o relatório final da Comissão Nacional da Verdade.

Os Amplos Poderes Presidenciais Conferidos pelo AI-5

De acordo com o artigo 4º do AI-5, “no interesse de preservar a Revolução”, o presidente estaria autorizado a “suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo de 10 anos e cassar mandatos eletivos federais, estaduais e municipais”

O AI-5, promulgado em 1968, concedeu ao presidente do Brasil amplos poderes, incluindo a dissolução do Congresso Nacional, das Câmaras estaduais e municipais, e a capacidade de legislar sobre qualquer matéria. Além disso, permitiu a intervenção federal em estados e municípios sem limitações constitucionais, substituindo os governadores e prefeitos por interventores nomeados pelo presidente. O Congresso foi dissolvido e reaberto apenas em outubro de 1969, enquanto a intervenção federal visava o “interesse nacional” e enfraquecia a autonomia local.