Síndrome de fim de ano: “período de insanidade social”, avalia psicanalista

Editoria Imag Por Editoria Imag
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Em época de Natal e Ano Novo, são comuns os sentimentos de ansiedade e uma espécie de euforia vazia. A atmosfera de esperança e gratidão pode tornar-se um fator de ansiedade e depressão para aqueles que se decepcionaram com o ano que viveram. Lembrar o que passou — o que fizemos ou o que deixamos de fazer — e criar novos planos para o ano seguinte pode desencadear sentimentos relacionados ao descontentamento. Com a pandemia, esse quadro piorou: em todo o mundo, a prevalência de ansiedade e depressão aumentou cerca de 25%, de acordo com dados da OMS , o que pode tornar o fim do ano um momento difícil para ainda mais pessoas.

A psicóloga e psicanalista Joana d´Arc Sakai explica que o erro de confundir desejos com metas pode provocar ainda mais frustração, pois há o perigo de tomarmos como certo o cumprimento daquele desejo transformado em meta. Ela acrescenta que as festas de fim de ano não representam, necessariamente, apenas alegria. “Também podem ser um período de angústia e ansiedade para algumas pessoas, porque sentem que têm a obrigação de serem felizes, quando na realidade não consideram que têm motivos para isso”, detalha.

No início do ano, também é comum que as pessoas façam uma espécie de “retrospectiva” sobre as realizações e as frustrações do passado e sobre os planos do futuro, de acordo com a psicóloga. “Nesse caso, quando o balanço indica que o planejado não foi alcançado, há a tendência do aumento da angústia”, diz ela. “Ou seja, fim de ano mobiliza sentimentos mistos. Alguns se recriminam por não ter atingido algumas promessas feitas no início do ano, como emagrecer ou parar de fumar, por exemplo, e ao mesmo tempo ficam felizes por entrar em um novo ciclo da vida”.

Nessa linha, a tristeza nas festas de final de ano pode ser entendida como uma melancolia característica do final de uma etapa, aliada a um julgamento severo das “falhas”, dos projetos não realizados. Para algumas pessoas, as festas são particularmente angustiantes e perigosas. É o caso de pessoas que convivem com vícios, que depois de algum tempo de abstinência, podem cair na tentação de voltar a beber ou consumir drogas por influência do clima natalino. “A pressão social é grande, principalmente no que diz respeito à bebida”, destaca a especialista.

Experiências de anos anteriores também influenciam a forma como nos sentimos. Quem perdeu entes queridos provavelmente terá que lidar com lembranças e, consequentemente, com mais tristeza. “O fim de ano é um período aguardado ansiosamente e ao mesmo tempo temido, devido ao medo sobre o que vai ou não acontecer”, explica Drª Joana d´Arc. Também pode entrar em cena a frustração de não receber amigos e presentes, ou de não se perceber importante para ninguém.      “A época é difícil principalmente para quem vive sozinho. Aumentam os casos de suicídio durante este período e nem todo mundo gosta de reuniões em família. A obrigação de estar feliz nas festas de fim de ano e o encontro nem sempre agradável com parentes são estressantes e podem provocar descompensações emocionais sérias”, afirma a psicóloga.

Ela sugere, então, que se busque a companhia de pessoas de quem gostamos, aumentando a interação o máximo possível. “Programe-se com antecedência para organizar a ceia, reunir os familiares e amigos e preparar tudo. Não deixe para a última hora, faça uma lista de providências, veja prioridades”, recomenda.

Há também, em finais de ano, um sentimento de urgência nas pessoas (terminar projetos, fazer coisas que deixaram de lado o ano todo, planejar o próximo ano) acrescido pelo cansaço físico e mental acumulados. “Nesse clima, é natural que as percepções nem sempre sejam tão claras, mas fica evidenciado o que não foi realizado, ou seja, o vazio dos projetos desprezados, não iniciados ou que não deram certo. Na pandemia, tudo isso ficou intensificado devido às incertezas vividas”, comenta a Drª Joana d´Arc Sakai.

“Balanços” das realizações e cobranças de ordem familiar, religiosa, profissional ou pessoal também geram crises, originando questionamentos como “por que fracassei?” ou “por que não fiz mais?”. “Conheça e respeite seus próprios limites, seja gentil consigo. O autoconhecimento através da psicoterapia possibilita o equilíbrio do dia a dia. Foque o esforço para o que é prioritário, evitando desperdício de tempo e desgaste emocional.”, aconselha a especialista. “Procure ajuda profissional, se trate bem, você merece. Faça psicoterapia para trabalhar suas questões internas descompensadas, desalinhadas ou desadaptadas”.

“Cuide das idealizações excessivas, pois imaginar se conseguirá realizar os objetivos, desejos, metas no próximo ano desgasta muito”, continua ela.”Que tal um final de ano sem tantas cobranças? Os planos mais importantes dizem respeito a nós mesmos: nossa forma de nos cuidarmos e respeitarmos.” Contudo, ela destaca que não ter nenhum plano para o ano seguinte também pode ser problemático, já que essa postura pode passar a sensação de “não ter futuro” ou de ficar “parado no tempo”.

“O que você mais deseja, nesse momento? Novo trabalho? Novo amor? Saúde? Seja o que for que esteja buscando, acredite-se merecedor. Ame-se antes, para então, dar ao outro e assim, receber reciprocamente”, afirma. Ela diz ainda que a depressão de fim de ano pode ser canalizada de forma positiva. “Pergunte-se o que precisa ser feito na sua vida. Esse é um grande momento para aprender a lidar de forma diferente com a própria vida. Por fim, permita que os sentimentos positivos perdurem, tornando 2023 um ano diferente e maravilhoso. Coloque-se em paz e, se sentir-se abandonado, lembre-se que o pior abandono é aquele que fazemos a nós mesmos”, conclui.

Foto Destaque: Reprodução

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