Cientistas identificam proteína capaz de dar longevidade a células humanas

Nicollas Alcântara Por Nicollas Alcântara
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Um grupo de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), em colaboração com cientistas da Austrália, alcançou um avanço significativo ao identificar uma proteína bacteriana com a capacidade de prolongar a saúde das células humanas. Esta descoberta tem implicações promissoras para o desenvolvimento de novos tratamentos para uma ampla variedade de doenças relacionadas à disfunção mitocondrial, incluindo câncer e doenças autoimunes.

Publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), o estudo revela que, entre as mais de 130 proteínas liberadas pela bactéria Coxiella burnetii quando invade as células hospedeiras, pelo menos uma delas demonstrou a capacidade de prolongar a longevidade celular através de uma interação direta com a mitocôndria.

 

Longevidade celular

Após a invasão da célula hospedeira, a C. burnetii libera uma proteína previamente desconhecida, chamada de MceF (sigla em inglês para “mitochondrial coxiella effector F“). Esta molécula interage com a glutationa peroxidase 4 (GPX4), uma enzima localizada na mitocôndria, melhorando assim a função mitocondrial e retardando os danos e a morte celular que podem ocorrer quando patógenos se replicam no interior das células dos mamíferos.

De acordo com Dario Zamboni, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP-USP) e um dos autores do estudo,

“A C. burnetii utiliza diversas estratégias para evitar a morte da célula invadida, permitindo assim sua replicação no interior dela. Uma dessas estratégias envolve a modulação da proteína GPX4 pela MceF, um mecanismo que descobrimos neste trabalho. Isso resulta na realocação dessas proteínas na mitocôndria celular, permitindo que as células dos mamíferos sobrevivam por mais tempo, mesmo quando estão infectadas e com uma alta carga bacteriana.”

A pesquisa foi conduzida no Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (CRID), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP, em colaboração com a professora Hayley Newton da Universidade Monash, na Austrália, e foi financiada através de um projeto coordenado por Zamboni.


Carrapato, o transmissor da bactéria da febre Q. (Foto: reprodução/Prefeitura de Jundiaí/Agência Brasil)


Implicações da bactéria na saúde

Além de sua relevância para a saúde humana, a C. burnetii, causadora da febre Q, foi objeto de estudo devido à sua capacidade de subverter as funções celulares, tornando-a altamente adaptada para infectar macrófagos e monócitos, suprimindo as respostas do hospedeiro contra a infecção. Ao contrário de outras bactérias que requerem uma alta carga para causar doenças, apenas uma C. burnetii é suficiente para adoecer uma pessoa saudável.

Este trabalho não apenas avança na compreensão das interações entre a C. burnetii e as células hospedeiras, mas também oferece insights valiosos sobre a disfunção mitocondrial e a morte programada de células humanas. O próximo passo da pesquisa envolve aprofundar a investigação das outras proteínas de interesse e realizar estudos bioquímicos para compreender melhor como a MceF influencia a proteína celular GPX4. Como observa Zamboni:

A beleza desse trabalho está na capacidade de aprender mais sobre sinalização celular, morte celular e formas de reverter a disfunção mitocondrial a partir do estudo de uma bactéria, sem a necessidade de inventar novas técnicas, já que esse processo ocorre naturalmente durante a interação entre essas bactérias e as células.”

O estudo também destacou a capacidade da bactéria de permanecer dentro da célula hospedeira por cerca de uma semana, em contraste com outras bactérias que causam a morte das células hospedeiras em menos de 24 horas.

 

Foto destaque: Células humanas com as proteínas MceF da Coxiella. A cor azul é o núcleo das células, a rosa são as mitocôndrias e os amarelos são as proteínas MceF. Reprodução/USP/Divulgação.

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