Uma pesquisa conduzida por acadêmicos da Faculdade de Medicina da USP, juntamente com pesquisadores da Universidade de Bristol e do King’s College, entre outras instituições, revelou que os desafios no processo de crescimento resultantes de características associadas ao transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) e ao autismo estão ligados ao surgimento de sintomas depressivos durante a adolescência e a fase adulta. O estudo começou com a análise de extensas bases de dados populacionais no Reino Unido, com o objetivo de determinar se crianças que exibiam características de ambos os transtornos poderiam estar mais propensas a desenvolver depressão mais tarde, uma preocupação que alguns especialistas já haviam observado em suas práticas clínicas.
A pesquisa identificou que a conexão entre esses transtornos e a ocorrência de problemas psiquiátricos está relacionada a questões específicas no desenvolvimento, como a dificuldade em lidar com emoções e situações desafiadoras, conhecida como desregulação emocional, que também influencia nas dificuldades em interações sociais e no desempenho acadêmico.
Criança segurando o símbolo que faz menção ao autismo. (Foto: Reprodução/Extra)
O pesquisador comenta
Luis Farhat, médico e pesquisador da USP, fala que “É sabido que, devido às alterações no desenvolvimento, crianças com TDAH e autismo têm maior probabilidade de enfrentar dificuldades em suas interações com colegas e de ter um desempenho acadêmico insatisfatório. O que esta análise demonstra é que esses fatores, somados à desregulação emocional, podem fornecer uma explicação para o desenvolvimento de sintomas depressivos nesses transtornos.”
“Nossa sugestão é que, focando nesses fatores funcionais (ao longo do tratamento), pode-se reduzir a chance de ter depressão mais adiante. É claro, é preciso mais comprovação, é um estudo que estimula mais pesquisas e mais investigação”, completa Luis.
Descoberta significativa
Conforme Farhrat, a estimativa é que crianças e adolescentes com TDAH apresentem de duas a quatro vezes maior probabilidade de desenvolver sintomas depressivos em comparação com indivíduos que não têm esse tipo de transtorno identificado, conforme demonstram pesquisas anteriores. Acredita-se que o autismo possa seguir uma métrica semelhante.
“Essa descoberta aponta na direção de possíveis abordagens para suavizar essa ligação. Não está gravado em pedra que a questão da depressão é imutável, e não podemos tomar medidas para enfrentá-la. Isso não é verdade. Devemos redobrar nossos esforços para proporcionar estabilidade a esses pacientes, e é fundamental que essas pessoas sejam acolhidas em todos os contextos, incluindo o ambiente acadêmico”, afirma Polanczyk.
O psiquiatra Guilherme Polanczyk, também um dos autores do estudo, afirma que a observação de que casos de autismo e TDAH podem evoluir para quadros depressivos não era algo novo em seu consultório. No entanto, compreender as causas por trás disso representa uma descoberta de grande relevância para o cuidado desses pacientes.
Foto destaque: Criança segurando o símbolo do espectro autista. (Reprodução/Shutterstock/Portal EdiCase)