Nesta segunda-feira, 30, foi ao ar a 15º temporada do programa Espelho, que vai ao ar às 23h, no Canal Brasil. O programa com apresentação do ator e diretor Lázaro Ramos, recebeu virtualmente atrações como o rapper Mano Brown, destaque do primeiro epsódio, que só não esteve antes no programa por problema de agenda; a escritora nigeriana Chimamanda Adichie, a cantora Gal Costa e os atores Silvero Pereira, Ary Fontoura e Maria Bopp, para uma conversa a respeito dos mais variados temas que, urgentes, precisam ser debatidos para uma reflexão mais atenta.
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Reprodução: Telepadi
Entre uma gravação e outra, Lázaro Ramos respondeu a algumas perguntas do Estadão sobre Espelho e outros temas. Confira a seguir:
O que vê de mais relevante em Espelho?
Eu acho que ao longo desses anos todos, o Espelho serve como um auxílio no enfrentamento aos problemas que a gente tem. A seleção dos entrevistados é pensando muito nisso, em oferecer alternativas para as pessoas através desse programa – que eu nem considero um programa de entrevistas, é um programa de escuta.
Chegar a 15ª temporada tem um gostinho a mais, principalmente por ser esse programa de entrevistas comandado por um homem empoderado?
Dá muito orgulho o Espelho chegar a tantos anos assim. Mas não por um gosto individual, mas sim por um grupo que faz parte desse programa. Ele é apresentado por mim, esse homem que eu sou mas ao mesmo tempo tem uma equipe que já está junta há muitos anos, e que faz o programa com muita paixão. Eu acho que é isso que faz com que ele seja tão longevo: a nossa produção, a equipe técnica, que fazem parte da criação, da seleção de entrevistados e da criação da estética do projeto. É uma vitória coletiva de um grupo que lá atrás começou a fazer um projeto que não sabia se ia durar apenas uma temporada ou só os cinco primeiros programas, e que agora celebra ser um dos programas mais longevos da história da TV por assinatura no Brasil. E falando dos temas que a gente fala, que nós consideramos relevantes, o sabor fica melhor ainda.
Após tantas temporadas, tantos anos, alguns temas necessitam retornar ao programa?
O Espelho é um projeto que retoma seus temas o tempo todo porque é um programa que fala muito sobre a construção de futuro. Então temas como racismo, machismo, o valor da cultura, a ética… isso sempre volta. Porque isso tudo faz parte da nossa luta diária: a gente estar atento para não cometer os mesmos erros. E mesmo que esses assuntos avancem, falar sobre os avanços é importante. E relembrar questões, para a gente se alertar e não repetir os mesmos erros também é importante. Por isso que, sim, os assuntos muitas vezes voltam.
Como cada temporada é pensada? Com a pandemia, o que mudou na elaboração dele?
A pandemia trouxe a necessidade de fazer o programa online. Coisa que eu estava rejeitando no princípio, mas depois a gente acabou tendo uma vantagem: porque como o programa era feito no Rio de Janeiro, a maioria dos entrevistados acabava sendo do Rio ou, no máximo, de São Paulo. Este ano a gente conseguiu trazer pessoas de outros lugares, juntar mais de uma pessoa nos programas, ter convidados como o Mano Brown, por exemplo, que a primeira vez que eu convidei foi há 11 anos e, por problemas de agenda, ele nunca conseguia fazer. Então, este ano, eu acho que o programa está com uma voz mais diversa ainda, no sentido da regionalidade e de entrevistados. E as temporadas são pensadas sempre avaliando qual o momento histórico que a gente está: se tem algum tema que a sociedade está pedindo pra debater, através de opinião dos seguidores das nossas redes, da equipe que já está junta há muito tempo… e sempre com o propósito de, a partir dessas entrevistas, oferecer alternativas de melhoras dos problemas da sociedade.
Quando pensam no convidado já têm o tema em mente ou é o contrário?
No geral, os programas têm um tema, mas eu me deixo levar muito pela interação do momento. Por mais que tenha uma pauta, perguntas feitas previamente, mas eu acredito que a grande força do Espelho é a conexão que a gente estabelece ali no momento de realizar a entrevista. Então muitas vezes a pauta é jogada fora e surgem coisas muito espontâneas, que eu acho que é o diferencial desse programa.
Como passou por esse período mais acirrado da pandemia? Aproveitou bem para produzir, trabalhar, se aproximar mais dos filhos?
Todas as opções acima (risos). Foi exatamente isso. Um processo que as pessoas viveram muito nas suas casas, uma aproximação maior com os filhos, muitas vezes com desafios, porque a gente teve que aprender a ficar 24 horas por dia juntos, com limitações, sem poder sair de casa quando queria, sem poder ver pessoas que são importantes para a nossa vida. Quanto ao trabalho, no primeiro momento eu achei que tinha que produzir muito e depois quando eu relaxei e vi que o meu trabalho poderia servir como uma terapia, aí sim eu comecei a produzir, mas respeitando muito os tempos que a gente está vivendo. Não tem muito outro caminho.
E você tem seu primeiro filme como diretor, como foi isso, como surgiu essa oportunidade?
Esse filme surgiu em 2012, um ano depois de eu ter dirigido Namíbia, Não!, do Aldri Anunciação, para o teatro. Eu percebi a potência que a história tinha para o cinema. E lá começamos a produzir e a buscar parceiros e parceiras. A princípio, não era nem um desejo meu dirigir, mas outras pessoas a quem eu ofereci tinham os seus próprios projetos e não puderam abraçar o Medida Provisória. O que foi bom porque, ao longo desses anos todos, eu fui me preparando para ocupar esse lugar e para contar a história da melhor maneira possível. E agora eu estou muito feliz porque enfim o público brasileiro vai poder ver o filme depois de uma trajetória linda nos festivais internacionais.
Racismo é um tema que não pode sair da pauta diária?
Racismo é um tema que eu desejo que saia da pauta diária. Meu desejo não é falar sobre racismo eternamente, muito pelo contrário. Mas o problema é que como, cada vez que ele mostra a sua cara, e ainda tem muita gente ignorante que comete racismo, a gente é convocado a falar dele novamente. Mas o meu grande sonho, na verdade, é que esse tema não exista mais. Mas ele só não existirá mais quando o racismo não existir mais.
Como você analisa a situação atual da cultura no País? Você é otimista?
Eu acredito que a arte permanecerá. Ela se reinventa ao longo do tempo. Chega crise, sai crise, e a arte sempre dá um jeito de estar na vida das pessoas e de ser feita. A indústria cultural eu vejo com muita preocupação, porque esses anos da pandemia abalaram muito vários profissionais – tanto os que estão à frente, quanto por trás das câmeras, nos palcos, nos bastidores. Muita gente desistiu, muita gente não resistiu, profissionais de grande qualidade foram muito abalados por não terem seu sustento. Não penso com otimismo mas eu penso com prudência. Porque eu acho que a cultura é muito estratégica para um país, para a indústria de empregos, para a difusão do País no exterior. E a minha atenção está toda voltada para entender quais são as estratégias que precisarão ser feitas para a gente cuidar desse bem tão precioso, sem pensar na ideologia de quem governa mas entendendo que a cultura precisa ser tratada com respeito e como um ponto estratégico de promoção da economia.
Foto destaque: Cosmo Nerd