Em conjunto com instituições da Argentina, Colômbia, Peru, Estados Unidos e nacionais, a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) captou por meio da pesquisa “Encarceramento em massa como motor da epidemia de tuberculose na América Latina e impactos projetados de alternativas políticas: um estudo de modelagem matemática” que o fator primordial para o aumento de casos de tuberculose na América Latina é o encarceramento; a população latina vem sendo privada de liberdade desde 1990, tendo quase duplicado.
Desde 2015, a ocorrência de tuberculose diminuiu em 8,7% mundialmente, enquanto aumentou em 19% na América Latina nesse mesmo tempo. Em 2022, mundialmente, 10, 6 milhões de pessoas foram atingidas pela tuberculose.
Estudo realizado pela Fiocruz e instituições parceiras
A pesquisa foi publicada na revista científica “The Lancet Public Health” na última terça-feira (15) e verificou o impacto da epidemia de tuberculose na população, além de analisar o efeito fora das prisões, uma vez que as cadeias de transmissão afetaram também a população geral.
Com dados coletados de 1990 a 2023, o principal objetivo do estudo foi entender o aumento de casos nas prisões e seu impacto na saúde pública. A pesquisa abrangeu seis países que representam 80% da população carcerária na América Latina, que também concentram 80% dos casos de tuberculose em áreas próximas.
Na América Latina, a clausura é responsável por 27% dos casos da doença. No Brasil, esse fator é ainda mais alarmante, representando 35% dos casos nacionais, superando até mesmo o total de pessoas vivendo com HIV/Aids.
O Ministério da Saúde, por meio do programa Brasil Saudável, destacou que a tuberculose está entre as 11 doenças que precisam ser reduzidas e eliminadas. Esses objetivos são apoiados por Julio Croda, pesquisador da Fiocruz e professor da UFMS, que enfatizou a necessidade de ações mais eficazes voltadas para a população encarcerada.
Segundo Croda, a meta é alcançar uma redução de 75% até 2030, reconhecendo que a eliminação total não será viável, mas uma redução significativa é possível. Ele ressalta que, dado que 25% dos casos de tuberculose na América Latina estão nas prisões e 40% no Brasil, é crucial alcançar essa parte da população de maneira assertiva; do contrário, a diminuição dos casos será inviável.
Por que os casos de tuberculose se intensificaram
As pessoas que estão encarceradas podem ser mais suscetíveis à tuberculose por várias razões. Muitas delas já estavam em risco de contrair a doença antes mesmo de serem presas, além das condições prisionais, que incluem ventilação precária, superlotação, desnutrição e acesso limitado à saúde. Esses fatores fazem com que a incidência da doença nesses locais seja 26 vezes maior do que na população geral.
A estrutura da pesquisa utilizou modelos dinâmicos de transmissão, que foram ajustados com base em dados históricos e atuais sobre privação de liberdade e tuberculose nos países analisados.
Os resultados indicaram que, caso intervenções sejam implementadas em relação à privação de liberdade, os casos de tuberculose poderiam ser reduzidos em mais de 10% entre a população geral da Argentina, Brasil, Colômbia, El Salvador e Peru.
Como exemplo, 27,2% dos novos casos da doença em 2019 foram atribuídos ao encarceramento, uma porcentagem significativamente maior em comparação a outros fatores de risco, como HIV e desnutrição.
Os pesquisadores envolvidos neste estudo enfatizam que os ministérios da Justiça, agências internacionais de saúde e programas nacionais de controle da tuberculose devem colaborar para enfrentar a crise sanitária atual, adotando estratégias que considerem o desencarceramento como uma forma de controlar a doença.
Adicionalmente, afirmam que essas intervenções devem ser realizadas não apenas para reduzir o número de casos de tuberculose, mas também para pôr fim à privação de liberdade em massa.