Nesta terça-feira (18), a juíza federal norte-americana Ana Reyes suspendeu o decreto assinado pelo presidente Donald Trump que proibia pessoas transgêneros de servir nas Forças Armadas dos Estados Unidos. A magistrada baseou sua decisão na Declaração de Independência, que estabelece que todos os seres humanos são “criados iguais”.
Diante desse fundamento, a juíza assinou uma liminar que assegura os direitos de todos os soldados trans de continuarem trabalhando segundo as regras que já haviam sido estabelecidas antes do decreto do presidente americano. Portanto, a medida é válida até que a constitucionalidade da ordem seja avaliada pela Justiça.
A proibição, no fundo, invoca linguagem depreciativa para atingir um grupo vulnerável, violando a Quinta Emenda.
Ana Reyes, juíza federal dos EUA
O Departamento de Defesa afirma que aproximadamente 4.200 membros da corporação das Forças Armadas são transgêneros, o que representa 0,2% da corporação. Os militares desempenham suas funções como pilotos, oficiais superiores, técnicos nucleares, soldados, marinheiros, aviadores e fuzileiros navais. Este grupo tem sido um alvo direto do governo Trump.
Ataque direto do governo Trump
O presidente americano assinou em janeiro deste ano uma ordem executiva declarando que a “adoção de uma identidade de gênero inconsistente com o sexo de um indivíduo entra em conflito com o compromisso de um soldado com um estilo de vida honrado, verdadeiro e disciplinado, mesmo na vida pessoal”.
A partir disso, o Departamento de Defesa publicou novas políticas, se alinhando à mesma linguagem do presidente Trump. As novas diretrizes informam que todos os soldados trans serão obrigados a sair das Forças Armadas, a despeito do mérito de cada um.
A princípio, o incentivo das Forças Armadas é para a demissão voluntária, com compensação financeira para acelerar a saída. A Marinha firmou o dia 28 de março como prazo limite para que os marinheiros trans solicitem sua demissão.
A reação foi imediata e militares entraram com processos judiciais contra as medidas alegando que a decisão configura discriminação ilegal que viola direitos constitucionais de tratamento igualitário.
No primeiro mandato de Donald Trump, as tropas transgêneros foram vencidas contra um decreto parecido, que acabou por ser bloqueado por juízes federais. Porém, o bloqueio vigorou por apenas dois anos, até 2019, quando uma decisão da Suprema Corte possibilitou uma reconfiguração da proibição até que sua constitucionalidade fosse analisada. Mais tarde, o governo Joe Biden suspendeu a decisão de Trump e arquivou o caso.
As Forças Armadas dos EUA têm um histórico de 77 anos de inclusão. A caserna americana sempre buscou acolher americanos diversos em uma proporção cada vez maior. Tradicionalmente, a Casa Branca era quem incentivava uma maior inclusão, a contragosto dos militares. O que se vê agora é uma completa inversão de papéis, em que o governo se opõe à qualquer tipo de inclusão e os militares defendem e lutam por ela.
O Departamento de Assuntos de Veteranos informou que atendimentos a militares que busquem procedimentos de afirmação de gênero não serão mais feitos. Segundo declaração do secretário do departamento, Doug Collins, na segunda-feira (17), caso veteranos queiram mudar de sexo, terão que fazer isso por conta própria.
Desdobramentos da ordem
Nas semanas seguintes à assinatura da ordem de Trump, os soldados foram forçados a usar seus pronomes antigos e a adotar padrões de higiene relacionados ao seu sexo de nascimento. Segundo o New York Times, muitos soldados não receberam atendimento médico quando necessário e foram forçados à licença administrativa, assim como enviados diretamente para casa após o cumprimento de suas missões.
A advogada Shannon Minter, que representa o grupo, disse que suas vidas e carreiras foram completamente interrompidas devido à ordem executiva e reforça que promover alívio imediato para a situação presente é fundamental. Mesmo que a decisão seja revertida, o fato é que dificilmente os militares conseguirão prosseguir com suas carreiras da mesma forma de antes.
Julia Becraft, sargento de primeira classe, designada para um batalhão de blindados do Exército do Texas, seria promovida a líder de pelotão em julho, porém sua promoção foi suspensa depois da ordem executiva. A decisão afetou diretamente o seu emocional e, por isso, a militar tirou férias para tratar de sua saúde mental em sessões de terapia. Ela afirmou ao Times que têm recebido muito apoio da sua unidade, mas a sua vida mudou completamente.
A Sargento Becraft serviu no Exército por 14 anos, participou de três missões no Afeganistão e recebeu uma Estrela de Bronze. Apesar disso, corre o risco de ser obrigada a deixar as Forças Armadas sem nenhum benefício de aposentadoria. Toda a situação fez com que ela se questione se realmente vale a pena servir o seu país. Becraft afirma estar com medo após as ações deste governo.