[Crítica] Terceiro episódio de Percy Jackson questiona bondade dos deuses e apresenta Medusa

Tailane Santos Por Tailane Santos
18 min de leitura

Na última terça-feira (26), foi ao ar o terceiro episódio da primeira temporada da série “Percy Jackson e os Olimpianos”, baseada na saga de livros de mesmo nome, do escritor Rick Riordan. O episódio, que já estava liberado às 23h, seguiu o começo da missão de Percy, desde a escolha de quem o acompanharia, até seu encontro com Medusa. Entretanto, foi um episódio morno e de certa forma, fácil.

“Nossa visita ao Empório de Anões de Jardim”


Pôster do primeiro episódio (Foto: reprodução/Instagram/@percyseries)


Você irá a Oeste, enfrentar o deus que se tornou desleal
Irá encontrar o que foi roubado, e o verá devolvido em segurança
Será traído por aquele que o chama de amigo
E, no fim, irá fracassar em salvar aquilo que mais importa
.” ~ Livro “O Ladrão de Raios”

O episódio começa com Percy indo até o sótão onde fica o Oráculo de Delfos. No livro, é descrito como um lugar cheio de sucata, como armaduras, escudos, potes, entre outros objetos empoeirados. Acredito que a série conseguiu traduzir bem o cenário, colocando ao centro uma figura de uma senhora velha, imóvel, iluminada pela luz do sol que passa a janela atrás de si. Ao contrário da retratação original, que traz uma múmia de corpo extremamente ressecado, a série prefere algo menos “agressivo”, apenas velho.

A função do Oráculo é dar a missão a Percy, com direcionamentos para auxiliá-lo no que deve ser feito. Entretanto, o garoto vê a figura apenas como decoração de Halloween, quando uma fumaça verde sai da boca da mulher, e se transforma na figura de seu padrasto Gabe, que explica o que ele deve fazer. É uma cena cômica, que ficou interessante pelo modo como o personagem fala e a forma como Percy reagiu a isso.


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Quando descobre isso, ele precisa escolher mais duas pessoas para acompanhá-lo na missão. No livro, ele está conversando com Quíron quando escolhe Grover para ir e Annabeth se voluntaria para a missão. Já na série, ele está reunido com outros semideuses, que Quíron afirma serem boas opções, os melhores heróis do acampamento para ajudá-lo, e ele escolhe Annabeth, que está na “lista”, e Grover, que não está.

Não gostei dessa mudança. Fica parecendo que o resto do acampamento não é “digno” de acompanhá-lo, além de trazer uma justificativa péssima para a escolha. É interessante que no livro, após a visita de Percy ao oráculo, o herói conversa com Quíron sobre a missão e tira suas dúvidas, além de reforçar o sentimento de família e acolhimento que o centauro transmite. Foi uma cena pouco aproveitada pela série. Também é divertido quando Annabeth chega se oferecendo, pois eles se provocam, e ela o chama de “cabeça de alga”, apelido este que ainda não apareceu na série.

Série suaviza história de Medusa

Outra coisa que mudou foi o encontro de Percy com Medusa. No livro, após fugirem do ônibus onde encontraram as fúrias, eles correm pela floresta e encontram uma casa cheia de estátuas na frente, chamada “Empório de Anões de Jardim da Tia Eme”. Grover acha o lugar muito estranho, mas os dois semideuses são atraídos pelo cheiro de comida e só depois descobrem que se trata de Medusa. O “monstro” é descrito vestindo um longo vestido preto e um véu, que cobria todo o corpo, deixando apenas as mãos de fora, que presumiam que ela fosse uma senhora mais velha.

Já na série, Percy e seus amigos fogem do ônibus sendo perseguidos pela fúria, que para assim que chega ao Empório. Annabeth logo percebe que se trata da casa de Medusa, e quer fugir dali, mas estão cercados. Como a mãe de Percy sempre defendeu a figura mitológica, Percy acredita quando ela diz que apenas os está oferecendo uma refeição e decide entrar, sendo seguido por Grover e Annabeth, contrariada. Achei que cortou a surpresa da situação, de deixar os fãs apreensivos e curiosos sobre quem seria a “Tia Eme”.

Medusa é apresentada como uma mulher mais nova, de seus 30 a 40 anos, com um vestido leve, rosa, e um chapéu cobrindo seus olhos. Acredito que o filme de 2010 soube trabalhar melhor com a personagem, trazendo uma mulher mais elegante, séria, e que mostra verdadeira revolta pelo que aconteceu a ela. Além de tudo, a série arrastou bastante a cena, dando foco ao diálogo das personagens, tendo a cena de ação “cinco minutos”. Não teve apreensão para o desfecho e como eles sairiam do local; eles pensaram por alguns minutos e cortaram a cabeça da Medusa. Simples assim. A conversa que ela teve com os personagens foi muito importante, mas poderia ser trabalhada de forma a prender melhor o espectador.


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A história de Medusa também foi levemente modificada. Duas versões são mais conhecidas e difundidas entre os fãs de “Percy Jackson” e consumidores de mitologia grega. A primeira é sobre Medusa ter sido atraída e depois abusada por Poseidon no templo de Atena, enquanto a segunda fala sobre um consentimento da mulher em profanar o templo da deusa. Nas duas versões, Atena a amaldiçoa, transformando-a em um monstro com cabelos de cobra e olhar que transforma quem a encara em pedra.

Na série, a história teve uma pequena mudança, para que fique mais leve. A personagem conta que idolatrava a deusa Atena, mas essa não a notava. Poseidon, então, apareceu na vida dela, e começou a fazê-la sentir-se especial, reforçando que a amava. Atena não gostou nada disso e a amaldiçoou daquela forma. Como se tivesse sentido ciúme por justo Poseidon, um dos deuses que ela mais detestava, ter ganhado a admiração da jovem mortal. Acredito que a parte sobre abuso tenha sido cortada pois é uma série voltada para o público jovem, então assuntos pesados e mais sombrios são atenuados para que não cause grande choque. Em matéria da Variety, a esposa do escritor fala um pouco sobre a decisão.

Novamente, o questionamento a respeito da bondade dos deuses e sua atenção para com os filhos e demais mortais é colocado à prova. Medusa indaga a adoração de Annabeth pela mãe Atena, destacando o quanto elas são iguais pois também sentia o mesmo, até ser amaldiçoada. Também reforça que os deuses não são justos, e sim intimidadores: “Os deuses querem que acredite nisso. Que eles são infalíveis. Mas só querem o que os intimidadores querem, eles querem que a gente se culpe pelos próprios defeitos deles”. Annabeth continua rebatendo que ela mente, mas percebemos que Percy analisa com mais atenção o que Medusa aponta, principalmente quando ele a acompanha até a cozinha e ela oferece ajuda em troca dele trair os amigos.

Relação Percy e Annabeth: Percabeth

A dinâmica entre Percy e Annabeth também é explorada, entretanto, com mais brigas. É comum que os dois briguem no começo, discutam o tempo inteiro sobre coisas simples, mas na série isso é visto com maior intensidade. Em alguns momentos, no livro, eles conseguem conversar tranquilos e mostrarem empatia um pelo outro, mas isso não é visto nessa produção. A interação deles, que deveria começar com ela acompanhando-o em algumas coisas do acampamento, começa, na série, apenas quando ele decide chamar ela para a missão, sendo as anteriores apenas aparições curtas e de poucas palavras.

Dessa forma, sobra tudo para esse terceiro episódio, e eles “de cara” se detestam. Annabeth adora liderar e faz isso naturalmente. Entretanto, sua atitude chega a ser um pouco “mandona”, o que deixa Percy incomodado. Ela mostra querer sempre estar certa e à frente, e costuma ignorar a opinião dos outros, reforçando que ela sabe o melhor para a missão. Por um lado, é importante trazer mulheres independentes e líderes, mas se não for feito com cuidado, criará efeito contrário, reforçando estereótipos de menina “surtada”, entre outros. Aguardemos como os produtores trabalharão com isso.


Percy e Annabeth discutindo no começo da missão (Foto: reprodução/Disney+)


Percy não fica por fora também, rebatendo qualquer coisa que ela fala e tratando algumas coisas sérias com desdém. A discussão entre os dois fica mais séria após matar a Medusa, e Grover entra no meio para tentar apaziguar e ao mesmo tempo fazer com que eles esclareçam o que está acontecendo. O sátiro critica a insensibilidade de Percy ao pedir que Annabeth deixasse o boné que ganhou da mãe para trás, ao passo que questiona do que ele tem tanto medo, visto que está tratando todos mal. Já para a semideusa, ele chama a atenção dela por criticar Percy por focar em salvar a mãe.

Também é revelado ali que Percy escolheu os dois para ir à missão devido à fala do Oráculo. Ele conta que a profecia dizia que ele seria traído por aquele que chamaria de amigo, então escolheu Annabeth por achar que eles nunca seriam amigos, e Grover por acreditar que este nunca o trairia. Mas ele logo sente que pesou o clima, e quer se desculpar com Annabeth.

Percy envia a cabeça da Medusa para o Olimpo

Uma parte icônica neste episódio, é quando Percy Jackson decide mandar a cabeça da Medusa para o Olimpo. Essa parte é abordada no livro, mas assistir deixou bem mais divertido. Já ao contrário do filme, em que ele leva a cabeça para casa e deixa na geladeira, aqui ele manda direto, sendo entregue pelo “Hermes Express”, tipo um correio dos deuses. Annabeth e Grover, claramente, são contra, e têm receio dos deuses acharem uma impertinência, ao passo que Jackson simplesmente respondente: “Eu sou impertinente”, algo que claramente seria dito pelo personagem.

Easter eggs encontrados

O episódio termina com alguns easter eggs, uns explícitos e outros mais sutis. O primeiro é, como já mencionado, o correio dos deuses. O pacote é levado pelo próprio Hermes, acredito eu, e aí se seguem as demais referências. Ele carrega a caixa até o Empire State Building, onde os fãs conhecem como acesso para o Olimpo. O deus entra no elevador, gira uma chave que faz surgiu o botão de número 600, o “andar dos deuses”. Enquanto aguarda a subida, ele escuta música ambiente de elevador, que também é uma piada entre os fãs e que aparece nos livros.


Hermes no elevador para o Olimpo (Foto: reprodução/Disney+)


Impressões finais

Apesar de mudar um pouco a história de como eles encontram o Empório e como lidam com a Medusa, foi um episódio bem trabalhado. Trouxe questionamentos interessantes sobre os olimpianos e sua relação com o mundo mortal, além de retratar mais sobre o “ciúme” que os deuses sentem ao deixarem de ser adorados. Também trouxe luz sobre os monstros e um pouco de motivo de alguns agirem de determinadas maneiras.

No entanto, acredito que foi um episódio bem arrastado e lento, quase “morno”. As cenas foram tranquilas, nada chegou a deixar os espectadores apreensivos e com medo pelos personagens. As lutas foram fracas e simples, além de muito curtas. Nos momentos que a cena poderia render mais ação, como o encontro com Medusa, o episódio preferiu priorizar a conversa entre os personagens. Novamente, reitero ser algo essencial para a construção da narrativa e do modo como Percy passa a enxergar os deuses, mas poderia ter sido melhor adaptado.

Aguardemos os próximos episódios para notar se isso se manterá.

 

Foto destaque: pôster do terceiro episódio (Reprodução/Instagram/@percyseries)

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